Em precedente inédito, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina entendeu que o contribuinte que, de boa-fé, aproveita crédito de ICMS destacado em nota fiscal declarada inidônea depois não pratica crime de sonegação fiscal, pois tinha o direito ao crédito e não haveria como prever fato futuro que venha a colocar em xeque a operação que gerou o crédito.

Um empresário paulistano foi denunciado pelo Ministério Público de Santa Catarina por sonegação fiscal (art. 1º, incisos I, II e IV, da Lei nº 8.137/90) porque teria, como representante de pessoa jurídica, creditado ICMS incidente sobre operação comercial com empresa que, posteriormente, foi declarada inidônea pelo Fisco Estadual.

Em sua defesa, assessorada pela equipe de Penal Empresarial do KLA, o empresário sustentou sua inocência sob o argumento de que a declaração posterior de inidoneidade de cliente ou fornecedor afasta o dolo, imprescindível para o crime de sonegação fiscal, uma vez que, para o contribuinte de boa-fé, é imprevisível que uma seja declarada inidônea depois da emissão de Notas Fiscal e da escrituração do crédito de ICMS incidente sobre a operação.

O empresário demonstrou ainda que a Súmula 509 do STJ, relativa à licitude do aproveitamento de crédito de ICMS, deveria incidir também na esfera criminal, ante a dependência da existência de crédito tributário inscrito em dívida ativa para a configuração de crime tributário (Súmula Vinculante nº 24, STF).

A Súmula 509 do STJ prevê que "é lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda". Nesse sentido, o contribuinte que, de boa-fé, utiliza o crédito de ICMS nas circunstâncias da Súmula 509 do STJ atua no exercício regular de um direito, circunstância que, por ser uma excludente de ilicitude (art. 23, III, do Código Penal), afasta o crime de sonegação fiscal.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina acatou todos os argumentos do empresário para absolvê-lo da acusação de sonegação fiscal. No entendimento daquela Corte, "há dúvida razoável – em benefício do acusado – sobre a possibilidade de apropriação legítima desses créditos, impugnados pela Fazenda Pública, à luz da Súmula 509 do STJ, o que atrairia, possivelmente, a excludente de ilicitude do exercício regular de direito, preconizada no art. 23, III, do CP, o que permite a absolvição também com fundamento no art. 386, VI, do CPP".

No intuito de fechar o cerco contra as chamadas "empresas noteiras", ou seja, que "vendem" notas fiscais para gerar crédito de ICMS, as investigações criminais para apurar casos semelhantes têm se multiplicado em todo o país. De fato, não é de hoje que a esfera penal tem sido usada como ferramenta de pressão para que contribuintes satisfaçam o débito tributário. Basta mencionar que, por política criminal, reforçada pela jurisprudência, o pagamento – a qualquer tempo – do tributo gera a extinção da punibilidade do contribuinte acusado de sonegação fiscal.

Nesse cenário, a decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que poderá gerar jurisprudência, é paradigmática por ir de encontro ao ativismo judicial cada vez mais presente na esfera penal, com o translúcido afã arrecadador.

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