Nessa newsletter você vai encontrar:

  • STJ anula ação penal que não teve a presença do Ministério Público em todas as audiências
  • Justiça Federal tranca ação penal contra acusado de desmatamento por inépcia da denúncia
  • STJ reforma decisão de recebimento da denúncia em crime tributário por ausência de justa causa
  • TJ-MG rejeita denúncia contra três réus por ilegalidades em investigação conduzida pelo Ministério Público

STJ anula ação penal com ausência do Ministério Público em todas as audiências

O ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) concedeu ordem de habeas corpus para anular ação penal em que uma pessoa foi processada e condenada sem que o representante do Ministério Público tenha participado das audiências.

No caso, o promotor de Justiça faltou às audiências de instrução e o próprio magistrado ouviu a vítima e fez perguntas às testemunhas de acusação e defesa, atuando indevidamente no lugar do titular da ação penal. Ele usou a justificativa de que o art. 212 do Código de Processo Penal permite a complementação de perguntas pelo juiz sobre pontos não esclarecidos.

O ponto nevrálgico da decisão do STJ está no princípio do sistema processual acusatório, no qual as figuras de acusador (Ministério Público) e julgador (Magistrado) estão em sujeitos processuais distintos, em contraposição ao sistema inquisitorial – há muito superado – no qual o juiz é o responsável por acusar e julgar o acusado ao mesmo tempo.

Para o ministro Rogerio Schietti, a conduta do juiz comprometeu o devido processo legal e a imparcialidade do julgador, além de causar prejuízo ao réu, que foi condenado sem a intervenção do órgão acusador e com base em provas não produzidas sob o crivo do contraditório.

Segundo o ministro, “[A] estrutura acusatória do processo penal pátrio impede que se sobreponham, em um mesmo sujeito processual, as funções de defender, acusar e julgar, sem eliminar, dada a natureza publicista do processo, a iniciativa probatória do juiz, mediante fundamentação e sob contraditório, desde que assim proceda de modo residual e complementar às partes e com o cuidado de preservar sua imparcialidade, o que não ocorreu na espécie”.

Com a decisão, a ordem foi concedida pelo Superior Tribunal de Justiça para cassar a condenação do réu e anular a ação penal desde a audiência de instrução.

Justiça Federal tranca ação penal contra acusado de desmatamento por inépcia da denúncia

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (“TRF-1”) concedeu ordem de habeas corpus para determinar o trancamento de ação penal na qual o Ministério Público Federal (“MPF”) deixou de indicar, em sua denúncia, qual seria a norma complementar ao art. 50-A, da Lei n. 9.605/1998.

O MPF havia denunciado um produtor rural do Amapá pelo suposto cometimento de desmatamento ilegal de floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio público, sem autorização do órgão ambiental competente.

Após o recebimento da denúncia, o produtor rural impetrou ordem de habeas corpus perante o TRF-1 alegando a inépcia da denúncia, pois o crime imputado pelo MPF seria uma “norma penal em branco”, ou seja, depende da indicação de norma complementar que o regulamente.

Isto significa que, para incorrer no crime previsto no art. 50-A da Lei n. 9.605/1998, pressupõe-se o descumprimento de outro ato normativo, complementar, que regulamente exatamente a amplitude e a extensão do objeto especial de preservação, no caso, “floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio público”.

No entendimento do TRF-1, a falta de indicação precisa da norma complementar não significa preciosismo ou apego demasiado a detalhes processuais, mas consiste na efetiva necessidade de garantia à ampla defesa do acusado no processo criminal. Assim, o art. 41 do Código de Processo Penal impõe ao órgão acusador a necessidade de indicação precisa dos atos normativos que obrigam, no caso, a obtenção de autorização administrativa e a caracterização da área como terra de domínio público, a fim de atender a exposição do fato tido como criminoso e todas as suas circunstâncias.

Assim, foi reconhecida a inépcia da denúncia oferecida pelo MPF contra o produtor rural, determinando-se o trancamento da ação penal por ausência de preenchimento dos requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, em importante precedente sobre os crimes ambientais classificados como “norma penal em branco”, que dependem de regulamentação complementar.

STJ reforma decisão de recebimento da denúncia em crime tributário por ausência de justa causa

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) deu provimento a um Recurso Especial (“RESP”) a fim de reformar uma decisão de recebimento da denúncia referente ao crime de sonegação de contribuição previdenciária, por ausência de justa causa.

No caso concreto, os recorrentes e mais três corréus haviam sido denunciados pela prática do crime de sonegação de contribuição previdenciária. Inicialmente, o juízo recorrido havia rejeitado a denúncia por ausência de justa causa, uma vez que a alegação acusatória estava pautada em sentença proferida na esfera trabalhista, que reconheceu que os denunciados teriam deixado de recolher contribuição previdenciária ao omitir remunerações pagas ou creditadas a um ex-funcionário.

Irresignado, o Ministério Público interpôs Recurso em Sentido Estrito perante o TRF-3, que reformou a decisão proferida pelo juízo recorrido a fim de determinar o recebimento da denúncia, sob o fundamento de que a sentença trabalhista condenatória seria suficiente para constituir o crédito tributário após sua liquidação, por possuir força de título executivo das contribuições previdenciárias por ela reconhecidas, dispensando-se, portanto, a instauração de um procedimento administrativo.

A defesa dos recorrentes, por sua vez, interpôs Recurso Especial buscando a rejeição da denúncia perante o STJ. Em seu voto, a relatora, ministra Laurita Vaz, destacou que o delito de sonegação de contribuição previdenciária somente se consuma com o lançamento definitivo do crédito tributário.

Ainda, conforme bem destacado pela relatora e em observância aos precedentes já consolidados no STJ e no Supremo Tribunal Federal (“STF”), há independência entre as instâncias criminal e trabalhista, de modo que, ainda que a sentença trabalhista tenha o condão de reconhecer a existência do crédito tributário, ela não é capaz de substituir o lançamento e a constituição, uma vez que tais etapas somente podem ser atingidas após o regular trâmite de procedimento administrativo fiscal.

Assim, diante da ausência de lançamento definitivo do crédito tributário, a relatora entendeu que não estava consumado o delito, de modo a dar provimento ao Recurso Especial e determinar a rejeição da denúncia por ausência de justa causa para a ação penal.

A decisão é de extrema importância, pois encontra respaldo nos precedentes já consolidados no STJ e na Súmula Vinculante nº 24/ STF, bem como norteia a utilização do Direito Penal como ultima ratio.

TJ-MG rejeita denúncia contra 3 réus por ilegalidades em investigação conduzida pelo Ministério Público

A 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (“TJMG”) deixou de receber denúncia por crime de responsabilidade contra um prefeito e dois empresários em razão de ilegalidades verificadas na investigação conduzida pelo Ministério Público de Minas Gerais (“MPMG”).

No caso concreto, um prefeito e dois empresários eram investigados no bojo de um Procedimento Investigatório promovido pelo Ministério Público pela suposta prática de irregularidades em procedimento licitatório. Referida investigação, contudo, não observou os contornos legais aplicáveis aos atos investigativos, os quais devem ser observados pelos membros do Ministério Público nas situações em que desempenham atribuições conferidas ao delegado de polícia, conforme decisão proferida pelo STF no julgamento do no RE 593.727/MG em 2015.

Em sede de memoriais, um dos denunciados pleiteou a rejeição da denúncia, sob a alegação de que, considerando que o inquérito policial havia sido promovido pelo Ministério Público, haveria ilegalidade e inconstitucionalidade na instauração feita por meio de investigação interna do Ministério Público para apurar infrações penais ou administrativas.

Em seu voto, o relator, desembargador Dorgal Borges de Andrada, destacou que houve ilegalidade em três momentos da investigação conduzida pelo Ministério Público, haja vista que houve:

  • (i) inobservância do prazo de 30 dias para conclusão das investigações,
  • (ii) ausência de convocação do investigado para ser ouvido durante as investigações e
  • (iii) ausência de controle jurisdicional dos atos da investigação, uma vez que as prorrogações de prazo ocorreram de forma ilegal e sem que houvesse autorização ou conhecimento do Poder Judiciário.

Na oportunidade, uma vez que a denúncia ainda não havia sido recebida, o relator determinou a baixa dos autos à comarca de origem dos fatos para a realização do interrogatório de um dos investigados pela autoridade policial, a fim de garantir seu direito ao interrogatório, sob pena de não recebimento da denúncia em razão da ilegalidade das investigações e consequente falta de justa causa para a ação penal.

Quando aos demais denunciados, foi determinada a rejeição da denúncia, uma vez que ambos haviam celebrado Acordo de Colaboração Premiada com o Ministério Público.

A decisão proferida pela 4ª Câmara Criminal do TJ-MG é salutar uma vez que reafirma o compromisso de salvaguarda da garantias constitucionais dos investigados, bem como demonstra aderência a um movimento normativo que busca uma proteção penal garantista, que pode ser observado na Lei de Abuso de Autoridade, por exemplo, que trouxe a tipificação criminal da prorrogação de investigações sem justificativa legal.

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