DECRETO-LEI N.º 123/2017, DE 25 DE SETEMBRO

Foi publicado em Diário da República, no passado dia 25 de setembro, o Decreto-Lei n.º 123/2017, previsto no artigo 3.º da Lei n.º 15/2017, de 3 de maio, que veio instituir a proibição da emissão de valores mobiliários ao portador, aplicável desde 4 de maio último, e impor a conversão dos valores mobiliários ao portador em circulação em nominativos.

O Decreto-Lei n.º 123/2017, de 25 de setembro, veio agora regulamentar o processo de conversão dos valores mobiliários ao portador em circulação em valores mobiliários nominativos, que terá de ser implementado no prazo máximo de 6 meses a contar da entrada em vigor da Lei 15/2017, de 3 de Maio, ou seja, até dia 4 de novembro de 2017 ("Período Transitório").

I. A RESPONSABILIDADE DAS ENTIDADES EMITENTES PELA PROMOÇÃO DO PROCESSO DE CONVERSÃO

Além da já referida proibição de emissão de novos valores mobiliários ao portador, aplicável desde 4 de maio, todas as entidades emitentes de valores mobiliários ao portador passam a estar obrigadas, nos termos do artigo 2.º, n.º 2, do mencionado Decreto-Lei, a promover, a sua expensas e até ao final do Período Transitório, o processo de conversão em valores nominativos dos valores mobiliários ao portador que se encontrem em circulação, de forma a permitir a clara identificação do respetivo titular.

A iniciativa desta conversão é, assim, entregue às próprias entidades emitentes, não dependendo de prévia solicitação por parte dos titulares dos valores mobiliários ao portador.

II. O PROCESSO DE CONVERSÃO

O processo de conversão iniciar-se-á com a deliberação social de conversão dos valores mobiliários ao portador em nominativos, a qual poderá ser tomada pelo conselho de administração da sociedade, sem necessidade de aprovação dos sócios ou obrigacionistas, reunidos em assembleia geral. A referida deliberação deverá igualmente aprovar a alteração dos estatutos das sociedades emitentes, dos quais terá de passar a constar a referência à natureza nominativa das ações, cfr. resulta da alínea d) do artigo 272.º e do artigo 299.º do Código das Sociedades Comerciais ("CSC"), na redação introduzida pela Lei n.º 15/2017, de 3 de maio, ou de outros valores mobiliários em circulação.

Note-se que, nos termos do Decreto-Lei, a alteração dos estatutos não está formalmente dependente da prévia conclusão do processo de conversão dos valores mobiliários. Assim, poderá dar-se o caso de os estatutos das sociedades emitentes passarem a referir que todos os valores mobiliários têm natureza nominativa quando, na realidade, permanecem em circulação valores mobiliários ao portador, o que é, no mínimo, incongruente.

Pese embora o referido normativo atribua competência ao conselho de administração para aprovar a conversão, deverá entender-se que esta competência não exclui a competência da assembleia geral das sociedades emitentes para deliberar sobre esta matéria. Estamos até em crer que, numa considerável parte dos casos – sobretudo nas sociedades anónimas em que a dispersão do capital social seja menor -, serão as assembleias gerais a deliberar sobre esta conversão das ações (ou outros valores mobiliários) ao portador.

Após esta deliberação, as sociedades comerciais e as demais entidades emitentes de valores mobiliários ao portador terão de publicar, até ao final do Período Transitório, um anúncio que informe os titulares dos valores mobiliários visados da sua conversão ("Anúncio"). O Anúncio terá de ser publicado no sítio na internet da entidade emitente, a existir, e na página das publicações online do portal do Ministério da Justiça. No caso de (i) emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado ou sistema de negociação multilateral, ou de (ii) emitentes com o capital aberto ao investimento do público, o Anúncio terá ainda de ser publicado no Sistema de Difusão de Informação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

O Anúncio terá de indicar, designadamente, (i) a identificação dos valores mobiliários convertidos, (ii) a fonte normativa em que assenta a decisão de conversão, (iii) a data da deliberação das alterações aos estatutos e demais documentos relativos à conversão dos valores mobiliários, com indicação do órgão deliberativo, (iv) a data prevista para a apresentação do pedido de registo comercial das alterações ao contrato de sociedade e aos demais atos sujeitos a registo comercial, e (v) as consequências da não conversão dos valores mobiliários até ao fim do Período Transitório.

Tratando-se de valores mobiliários titulados não integrados em sistema centralizado, o Anúncio deverá indicar que, para efeitos da sua atualização ou substituição, os títulos deverão ser apresentados, até 31 de outubro de 2017, junto do emitente - ou de intermediário financeiro por este indicado - pelos respetivos titulares ou, mediante instruções e por conta destes, pelas entidades depositárias (definidas no artigo 99.º do Código dos Valores Mobiliários) ou pelas entidades que tenham os títulos em sua posse, nomeadamente os beneficiários de garantias.

Tratando-se de valores mobiliários ao portador integrados em sistema centralizado, o Anúncio deverá igualmente mencionar a data prevista para a conversão ocorrer no sistema.

III. COMO SE FORMALIZA A CONVERSÃO?

De acordo com o artigo 4.º do Decreto-Lei, a conversão far-se-á:

(i) Através de anotação na conta de registo individualizado dos valores mobiliários escriturais ao portador ou dos valores mobiliários titulados ao portador integrados em sistema centralizado; ou

(ii) Por substituição dos títulos ou por alteração das menções deles constantes, a realizar pelo emitente. Neste caso, o emitente - ou a entidade gestora do sistema centralizado, sempre que os valores mobiliários estejam ali integrados - deverá promover a inutilização ou destruição dos títulos objeto de conversão.

O procedimento acima referido também se aplicará à conversão dos valores mobiliários titulados ao portador que estejam depositados em intermediário financeiro devido à sua emissão ou série ser representada por um único título.

IV. A CONVERSÃO COMPULSIVA

Este novo regime estabelece ainda um procedimento (especial) de conversão "compulsiva", que apenas se aplicará (i) aos valores mobiliários ao portador integrados em sistema centralizado, e (ii) aos valores mobiliários escriturais ao portador registados num único intermediário financeiro, no caso de não terem sido convertidos, por iniciativa do emitente, até ao termo do Período Transitório.

Verificando-se este cenário, as entidades gestoras do sistema centralizado ou o intermediário financeiro, conforme aplicável, terão, por sua iniciativa, de converter os valores mobiliários ao portador em nominativos no último dia do Período Transitório (4 de novembro de 2017), sendo ainda obrigadas a divulgar publicamente todos os valores mobiliários compulsivamente convertidos.

V. A OBRIGAÇÃO DE ATUALIZAÇÃO DE REGISTOS

Na sequência da conversão, caberá aos emitentes, às entidades gestoras de sistemas centralizados ou às entidades registadoras atualizar os respetivos registos dos valores mobiliários, entre os quais se incluem, no caso dos emitentes, os suportes de registo de emissões de valores mobiliários (no caso das ações, os comummente denominados "livros de registo de ações").

Caberá ainda aos emitentes requerer o registo comercial das alterações aos estatutos decorrentes desta conversão, que beneficiarão de uma isenção de emolumentos.

No caso de a conversão ter sido promovida pelo emitente, o pedido de registo junto da Conservatória do Registo Comercial deverá ser instruído com (i) a deliberação da entidade emitente, (ii) a nova redação (consolidada) do contrato de sociedade e (iii) quaisquer outros documentos que titulem a conversão.

Nas circunstâncias em que tenha ocorrido uma conversão "compulsiva", bastará, para efeitos do registo comercial, a apresentação de uma declaração emitida pela entidade gestora ou pelo intermediário financeiro responsável pela conversão.

Enquanto não se encontrarem concluídas as formalidades da conversão (referidas na secção III supra), deverá constar da certidão permanente do registo comercial da entidade emitente a menção da pendência do processo de conversão, devendo esta promover o encerramento do processo de conversão quando o mesmo se encontrar concluído.

VI. CONSEQUÊNCIAS DO INCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE CONVERSÃO PARA OS TITULARES DE VALORES MOBILIÁRIOS AO PORTADOR

Nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2017, de 3 de maio, os titulares de valores mobiliários ao portador que não se encontrem convertidos até ao próximo dia 4 de novembro ficarão, a partir dessa data, impossibilitados (i) de transmitir esses valores e, bem assim, (ii) de exercer os seus direitos de receber os resultados associados aos valores mobiliários não convertidos (tais montantes ficarão retidos numa conta especialmente aberta pelo emitente para esse fim, e apenas poderão ser entregues uma vez concluído o processo de conversão).

Assim, após o final do Período Transitório, os valores mobiliários ao portador que não tenham sido convertidos apenas permitirão ao respetivo titular solicitar ao emitente o registo de tais valores a favor do próprio titular. No caso de valores mobiliários ao portador titulados, os títulos representativos dos valores mobiliários deverão ser apresentados junto do emitente, para que se proceda à sua conversão. Os valores mobiliários escriturais (i) integrados em sistema centralizado ou (ii) registados num único intermediário financeiro, que tenham sido compulsivamente convertidos (nos termos da secção IV supra) não estarão sujeitos a este regime.

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