O governo Bolsonaro se prepara para concretizar, a partir de amanhã, o principal trunfo de sua meta fiscal para 2019 e um pilar importante do pacto federativo. Por dois dias seguidos, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) realizará dois leilões de áreas do pré-sal, dentre os quais o aguardado megaleilão dos excedentes da cessão onerosa, há três anos em gestação e que promete ser o maior da história da indústria brasileira de óleo e gás. Tendo manifestado interesse por dois ativos colocados à venda no leilão dos excedentes e por três na 6ª Rodada da Partilha, a Petrobras desponta como protagonista das duas licitações, que somam R$ 114 bilhões em potencial de arrecadação. 

Na última semana, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse que a empresa "vai entrar para ganhar" as áreas de Búzios e Itapu, na rodada dos excedentes. A estatal sinalizou ainda que está disposta a investir no leilão mais do que os R$ 34 bilhões que receberá da União pela renegociação do contrato da cessão onerosa. Esses recursos dão espaço para que a empresa reforce sua presença no pré-sal e aumente a sua fatia nos ativos colocados à venda. Se a Petrobras entrar com a fatia mínima de 30% nas áreas pelas quais manifestou interesse previamente nos dois leilões, ela terá de desembolsar R$ 22,8 bilhões. 

O discurso agressivo da estatal contrasta com a discrição das concorrentes. Duas das maiores petroleiras do mundo - francesa Total e britânica BP - já declinaram da licitação. A desistência das duas companhias acentuou o receio do governo sobre a possibilidade de que alguns blocos do leilão de amanhã não recebam propostas. Em Brasília, um cenário sem lances para os campos de Sépia e Atapu já é tratado como factível. 

O sócio da área de energias e recursos naturais da KPMG, Anderson Dutra, porém, acredita que todas as áreas do leilão de excedentes serão negociadas. Para ele, pelo conhecimento adquirido nas áreas que serão leiloadas, a Petrobras é favorita aos ativos que disputar e que, quem entrar como sócio dela na licitação, terá um diferencial competitivo. Ele cita a americana ExxonMobil, as europeias Shell e Equinor e as asiáticas Qatar Petroleum (QPI), CNODC e Petronas como potenciais candidatas a participarem do leilão. 

A Wood Mackenzie vê as estatais asiáticas, que buscam repor reservas, como candidatas a entrarem como sócias minoritárias no leilão. O chefe de pesquisa na área de exploração e produção da consultoria na América Latina, Marcelo de Assis, acredita que Shell e Petrogal possam comprar Atapu. Ambas são sócias da Petrobras no campo de Oeste de Atapu, cujas reservas se conectam com o ativo a ser leiloado e que passará por unitização (individualização da produção) com a área ofertada na rodada. 

Ali Hage, sócio da área de óleo e gás do Veirano Advogados, também acredita no sucesso da licitação. "Esse leilão tem uma característica única. É diferente de qualquer outro e provavelmente não vai se repetir em nenhuma situação. Estamos falando de leilão de reservas, de áreas onde já há descobertas, com volumes garantidos." 

Diante desse potencial, a ANP prevê que o megaleilão destrave investimentos de R$ 420 bilhões. No campo fiscal, o aumento de produção decorrente da licitação pode gerar, em 35 anos, R$ 1,95 trilhão em receitas à União, Estados e municípios. 

Mas também há quem veja prejuízos com o certame. Estudo assinado pelos ex-diretores da Petrobras, nas gestões do governo PT, Guilherme Estrella e Ildo Sauer, indica que o país poderá perder, com o leilão, cerca de US$ 300 bilhões ao longo de 30 anos, num cenário de preços do petróleo de US$ 60 por barril. Eles alegam que, se a União contratasse a Petrobras, teria controle sobre o ritmo de produção das áreas da cessão onerosa, acelerando ou reduzindo a extração, dependendo da variação do preço das commodities. 

Além das críticas, uma ação popular, com pedido de liminar, movida por petroleiros na Justiça de Federal de São Paulo, pede a suspensão do megaleilão. Em nota, os advogados Maximiliano Garcez e Rodrigo Salgado, da Advocacia Garcez, que representa os autores da ação, afirmam que a legislação não dispõe sobre licitações de blocos coincidentes com campos já declarados comerciais sob o regime de cessão onerosa e nem a possibilidade de acordo de coparticipação". 

Em 2014, no mandato de Dilma Rousseff, a expectativa era de que a União contratasse a Petrobras, mas acordo nesse sentido foi questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que enxergou "fragilidades e deficiências" nos estudos que sustentavam essa alternativa. Foi em 2016, no governo Michel Temer, que surgiu a ideia de leiloar os excedentes. A medida foi vista como forma de a União levantar os recursos necessários para pagar a estatal pela revisão do contrato. 

Pelo acordo assinado em 2010, a União cedeu à Petrobras o direito de produzir 5 bilhões de barris no pré-sal, como parte da operação de capitalização que resultou no aumento da participação da União no capital da petroleira.

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