Mercado de Capitais

O presidente da República sancionou na última sexta-feira (20/09/2019) a Medida Provisória nº 881, de 30 de abril de 2019, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, convertendo-a na Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 (“Lei da Liberdade Econômica”). A nova Lei tem por objetivo desburocratizar os negócios no país.

Entre outras modificações, o texto sancionado alterou a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), esclarecendo o conceito de fundo de investimento, qual seja, a comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio, destinado à aplicação em ativos financeiros.

Os fundos de investimento sempre foram tratados e considerados como condomínios formados por cotistas e/ou investidores. Porém, o Código Civil, até a publicação da nova Lei, carecia de uma diferenciação explícita dos condomínios de fundos de investimento daquelas regras aplicáveis aos condomínios civis comuns. Tal ausência normativa poderia dar ensejo para interpretação errônea em relação à aplicabilidade da regra geral dos condomínios aos fundos de investimento. Desta forma, ao tornar explícito que fundos de investimento são condomínios “de natureza especial”, e atribuir à CVM a competência exclusiva e indiscutível em relação ao condomínio de tal natureza, a regra traz um impacto profundamente positivo que deve proporcionar indiscutível aumento de segurança jurídica para a indústria de fundos. 

Além disso, a primeira grande surpresa no texto envolve a dispensa do registro dos regulamentos de fundos de investimento em cartório, que hoje é condição imposta em praticamente todas as normas envolvendo fundos. Tal medida pode resultar em redução de custos e economia de tempo nos processos de constituição e alterações significativas em regulamentos.

Ainda no âmbito da Lei da Liberdade Econômica, foi facultado ao regulamento dos fundos de investimento (i) o estabelecimento de limitação da responsabilidade de cada condômino ao valor de suas cotas; e (ii) que autorizem a limitação da responsabilidade dos prestadores de serviços fiduciários (administradores), perante o condomínio e entre si, ao cumprimento dos deveres particulares de cada um, sem solidariedade. A avaliação da respectiva responsabilidade deverá ser feita ponderando os riscos inerentes às aplicações nos mercados de atuação do fundo de investimento, bem como a natureza de obrigação de meio de seus serviços.

Tais medidas buscam proteger os investidores de terem que assumir para si passivos do fundo, além de isentar os administradores responsáveis pelo gerenciamento das aplicações e pela escolha de risco de responder pelas obrigações do fundo, salvo nas hipóteses de dolo ou má-fé. Dessa forma, pela nova regra, na hipótese de o fundo não possuir patrimônio suficiente para quitar as cotas em resgate, os cotistas figurarão na lista de credores em observância às regras de insolvência do Código Civil. A insolvência poderá ser requerida judicialmente por credores, por deliberação própria dos cotistas do fundo de investimento, nos termos de seu regulamento, ou pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Cumpre ressaltar que a adoção da natureza limitada pelos fundos de investimento no âmbito da Lei da Liberdade Econômica só surtirá efeito caso a mudança esteja estabelecida em regulamento.

Entre as principais inovações trazidas pela Lei da Liberdade Econômica está a permissão para a criação de classes diferenciadas de cotas (que já existem em alguns tipos de fundo como os de Participação “FIP” e os de Direitos Creditórios “FIDCs”, mas agora com direitos e obrigações distintos e patrimônio separado das demais). A medida tem por objetivo proteger investidores de terem que assumir para si passivos do fundo e, ainda sujeita a regulamentação específica por parte da CVM, nos leva a crer se tratar de um tratamento possivelmente similar, por exemplo, às “Segregated Porfolio Companies” existentes em outras jurisdições.

Trata-se, portanto, de modificações que visam garantir a autonomia dos fundos de investimento para torná-los cada vez mais atrativos aos investidores, tanto locais como estrangeiros.

Muito bem vista pelo mercado, a Lei da Liberdade Econômica é resultado da tentativa do Governo Federal de destravar as relações empresariais e a expectativa é que as medidas relacionadas a fundos impactem positivamente o mercado de capitais. Portanto, para a CVM, que já possui em seus planos de curto prazo metas para a redução de custos de observância, a nova Lei vem em momento bastante oportuno. Caberá, portanto, à autarquia acompanhar a velocidade adequando as suas normas para tanto.

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